Ontem, durante a conferência de imprensa em
que apresentou o mefítico orçamento de estado para 2013, o ministro das
finanças Vitor Gaspar desvendou: «a minha educação foi
extraordinariamente cara».
Não duvido.
Não duvido, porque, como sabe qualquer produtor cinematográfico de Hollywood, fazer monstros custa muito dinheiro.
À luz disso, vale a pena citar uma passagem do extraordinário romance Hopeful Monsters, escrito por Nicholas Mosley que, filho
do fundador da British Union of Fascists e
enteado da cascarrítica Diana Mitford, também foi educado para ser
monstro, mas sempre recusou ser bom aluno e tornou-se, em vez disso, um
lúcido denunciador de monstruosidades: «if we are to survive in the
environment we have made for ourselves, may we have to be monstrous
enough to greet our predicament?»
Com efeito, há perguntas que já trazem as respostas com elas.
O orçamento de estado para 2013 foi entrevisto com finura procrustiana:
à medida da cama de ferro na qual o governo quer deitar-nos para
decepar o que fica de fora. E nem os mais altos (os mais ricos) e os
mais baixos (os mais pobres) escapam ao amputatório ardil, porque, como
se sabe, o bandoleiro Procrustes não tinha apenas uma cama de ferro, mas
duas. Calculo que qualquer indivíduo de educação extraordinariamente cara saiba isso.
Horas depois dessa conferência de impressa, irrompeu fogo em frente à assembleia. Mas fogo primevo ou pira funerária?
Não
sei.
Só sei que me lembra um excerto de Man's Search For Meaning do
neurocientista Viktor Frankl, que sobreviveu ao holocausto:
«I understood how a man who has nothing left in this world still may know bliss, be it only for a brief moment, in the contemplation of his beloved. In a position of utter desolation, when man cannot express himself in positive action, when his only achievement may consist in enduring his sufferings in the right way - an honorable way - in such a position man can, through loving contemplation of the image he carries of his beloved, achieve fulfillment. For the first time in my life I was able to understand the meaning of the words, "The angels are lost in perpetual contemplation of an infinite glory."»
A tropa de choque paralisada na escadaria, à guisa de acentos circunflexos órfãos de vogais, é como as potestates de Frankl: perdida em perpétua contemplação da auréola flamante que esbraseia à frente dela.
«I understood how a man who has nothing left in this world still may know bliss, be it only for a brief moment, in the contemplation of his beloved. In a position of utter desolation, when man cannot express himself in positive action, when his only achievement may consist in enduring his sufferings in the right way - an honorable way - in such a position man can, through loving contemplation of the image he carries of his beloved, achieve fulfillment. For the first time in my life I was able to understand the meaning of the words, "The angels are lost in perpetual contemplation of an infinite glory."»
A tropa de choque paralisada na escadaria, à guisa de acentos circunflexos órfãos de vogais, é como as potestates de Frankl: perdida em perpétua contemplação da auréola flamante que esbraseia à frente dela.
(O título deste artigo alude ao romance La Luna e i Falò de Cesare Pavese.)