sexta-feira, 29 de junho de 2012

Este Sábado: autógrafos na Bertrand das Caldas da Rainha


Amanhã, dia 30 de Junho (Sábado), estarei às 18H00 na livraria Bertrand do Centro Comercial Vivaci, nas Caldas da Rainha (Rua Belchior de Matos nº 11), para uma sessão de autógrafos e conversa com os leitores sobre o meu novo livro Compêndio de Segredos Sombrios e Factos Arrepiantes (Saída de Emergência, 2012).

Marquem nas vossas agendas, não faltem e passem a palavra: obrigado.


quarta-feira, 27 de junho de 2012

Opinião sobre "O Princípio da Sabedoria" de António de Macedo



Acrescento que a retrospectiva O Cinema de António de Macedo, que esta exibição inaugurou, continua pelo mês de Julho. Consultem a programação no site da Cinemateca de Lisboa e não faltem.

sábado, 23 de junho de 2012

O Cinema de António de Macedo: vídeo da apresentação


Este ciclo continuará por todo o mês de Julho, por isso consultem a programação no site da Cinemateca de Lisboa e não faltem. Uma oportunidade única para (re)descobrirem uma filmografia ímpar, inventiva e importante.


quarta-feira, 20 de junho de 2012

Sessão de autógrafos na Bertrand das Caldas da Rainha


No dia 30 de Junho (Sábado) estarei às 18H00 na livraria Bertrand do Centro Comercial Vivaci, nas Caldas da Rainha (Rua Belchior de Matos nº 11), para uma sessão de autógrafos e conversa com os leitores sobre o meu novo livro Compêndio de Segredos Sombrios e Factos Arrepiantes (Saída de Emergência, 2012).

Marquem nas vossas agendas, não faltem e passem a palavra: obrigado.


segunda-feira, 18 de junho de 2012

"O Evangelho do Enforcado": excerto em 'spoken word'


Excerto em spoken word do meu romance O Evangelho do Enforcado (Saída de Emergência, 2010). Neste trecho, o ainda infante Nuno Gonçalves, mais tarde o pintor dos Painéis de São Vicente, encontra pela primeira vez a presença misteriosa que nunca mais o deixará em paz: o Geronte.

"Compêndio de Segredos Sombrios e Factos Arrepiantes" na Livraria Ideal


Opinião sobre Compêndio de Segredos Sombrios e Factos Arrepiantes (Saída de Emergência, 2012) no programa Livraria Ideal, apresentado por João Paulo Sacadura:

«É David Soares, o nosso escritor mais fantástico e negro, que nos dá esta obra repleta de histórias reais e factos espantosos que revelam um mundo, também ele, negro, verdadeiro e admirável. Gárgulas, bestas, feitiços, pragas e vampiros povoam esta obra corajosa.»

Fica a ligação para a entrevista que dei ao programa Livraria Ideal, em Março de 2010: http://www.tvi24.iol.pt/videos/pesquisa/David+Soares/video/13238290/1


sexta-feira, 15 de junho de 2012

Excerto exclusivo de "A Lua do Loreto"


Segue-se um excerto exclusivo do texto A Lua do Loreto, uma necropsia da santidade e de Lisboa, que irei interpretar no primeiro espectáculo da Tertúlia dos Assassinos, no próximo dia 13 de Julho, organizado e musicado pelo extraordinário Charles Sangnoir. Sigam as novidades publicadas na página oficial da Tertúlia dos Assassinos (no Facebook) e apontem este dia nas vossas agendas: não faltem e passem a palavra.
«Circulares como um ponto final, embebidas em amnésico ruído de rua, as ruínas invisíveis dos Casebres do Loreto são uma Lua que ainda emulsiona os elementos de Lisboa: buzinas de automóveis, risos de mulheres, sabores artificiais provenientes de uma adjacente gelataria – mas também pedras extintas, sangue antigo – tão alucinatório quanto mênstruo estroboscópico – e surtos fantasmas de sofrimento.
Sob estes rios de turismo e alcatrão, lado a lado aos pisos inferiores do parque de estacionamento do Chiado, hibernam esqueletos de soldados ducentistas, alguns agarrando teimosamente a tecnologia do seu tempo: lâminas fósseis, exóticas quanto cascas de pré-históricos coleóides vampiromorfos, tão entorpecidas quantos os sestércios que polvilham como pimenta a sedimentar estratocracia da Praça de Luís de Camões. Pudendágrico, o vulto desse vate é um cenotáfio de seres esquecidos pelas gentes que, animadas por atavismo psicogeográfico, se conglutinam nas actuais noites de fins-de-semana para elucubrarem ébrios elmanismos: a topografia é destino e a freguesia da Encarnação é a morada celeste do satiríaco Bocage, que dela fez uma Nova Arcádia de deboche e deleitação.»

 (Imagem: desenho dos Casebres do Loreto, pelo olissipógrafo Júlio de Castilho.)

"Lisboa Triunfante": excerto em 'spoken word'


Excerto em spoken word do meu romance Lisboa Triunfante (Saída de Emergência, 2008). Neste trecho, pertencente ao capítulo "O Reino do Sol", um fabuloso animal é sacrificado de um modo muito especial para, no final, servir um propósito mais especial ainda.

(Este vídeo faz parte de uma série de excertos em spoken word dos meus romances, que estou a publicar regularmente no meu canal de YouTube.)

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Filmografia integral de António de Macedo na Cinemateca de Lisboa


É com enorme prazer que vos convido a assistir com a maior atenção a O Cinema de António de Macedo: uma retrospectiva da filmografia integral do cineasta e escritor António de Macedo (tanto as longas-metragens como as curtas) que será exibida na Cinemateca de Lisboa, em Junho e Julho. Terá início no próximo dia 22 (sexta-feira), com a exibição às 21H30 (na Sala Dr. Félix Ribeiro) do filme O Princípio da Sabedoria, com apresentação do próprio António de Macedo.

Com exibição dos filmes canónicos na carreira do cineasta, assim como títulos mais raros, esta é uma oportunidade de ouro para verem aquela que será uma das mais importantes, originais, sólidas, pertinentes e fulgurantes obras de Cinema de Autor produzidas em Portugal. É, também, a recuperação de um cinema de teor filosófico e fantástico que, até à data, é único e precioso na nossa cinematografia - em suma, é uma retrospectiva imperdível. Todos os filmes mostrados neste ciclo são cópias novas, tiradas no laboratório da Cinemateca de Lisboa; em paralelo, será editado um catálogo alusivo à retrospectiva.

Considero um privilégio ter um amigo como o António de Macedo e fico muito feliz por ver que esta, mais do que justíssima, homenagem lhe é feita de modo irrepreensível: parabéns, António!

Consultem os dias e os horários de Junho nesta ligação: http://www.cinemateca.pt/Programacao/Anexos/junho2012.aspx
A imagem da capa deste programa de Junho (com os actores Ruy de Carvalho e Isabel Ruth) pertence ao filme Domingo à Tarde (1965), de António Macedo.

Apareçam e passem a palavra.

«Arquitecto de formação, cineasta por vocação, mas também compositor, escritor e ensaísta, docente, António de Macedo é um protagonista singular do cinema português cujo panorama marcou entre os anos sessenta da sua estreia no contexto do Cinema Novo, época em que a sua obra é especialmente prolífera, e os anos noventa em que inflectiu de percurso, passando a dedicar-se mais activamente aos estudos e ensino universitários nas áreas das religiões comparadas, das tradições esotéricas, das formas literárias e fílmicas ou da sociologia da cultura, em que se doutorou em 2010.
A sua primeira longa-metragem DOMINGO À TARDE é, em 1965, o terceiro filme proa do Cinema Novo Português, produzido por António da Cunha Telles como OS VERDES ANOS de Paulo Rocha e BELARMINO de Fernando Lopes. Com ela António de Macedo afirmou-se no contexto do novo fôlego da cinematografia portuguesa dessa década, mas como sucedeu com outros nomes da sua geração o seu percurso começara antes, no domínio do formato curto: inicia-se com os experimentais A PRIMEIRA MENSAGEM e ODE TRIUNFAL e profissionalmente com VERÃO COINCIDENTE e NICOTIANA cuja originalidade chamou a atenção para o seu trabalho. Marca de água de toda a sua obra, cruzada por diversas influências e interesses, persistentemente apostada na experimentação das possibilidades visuais e sonoras no cinema (tanto nas curtas como nas longas-metragens, nas obras de ficção, documentais, institucionais e em filmes publicitários), essa originalidade revestiu-se, por outro lado, de uma dimensão polémica, em alguns casos feroz, que foi pontuando a receção dos seus filmes a partir de 7 BALAS PARA SELMA, a segunda longa-metragem.
A produtividade dos anos sessenta estendeu-se à década seguinte, que Macedo atravessou desafiando os imperativos da censura, antes de 1974 (depois de em 1970 ser um dos fundadores do Centro Português de Cinema, foi em 1974 que cofundou a cooperativa Cinequanon onde desenvolve a atividade de cineasta nos vinte anos seguintes), e dos cânones estabelecidos, estendendo as linhas mestras do seu cinema às questões sociais e políticas numa vertente documental. A dimensão fantástica, o imaginário popular e os elementos esotéricos dominam os filmes posteriores na convicção de que “a realidade é mais subtil do que aquilo que a gente vê. As incursões esotéricas que faço são tentativas de penetrar no universo real. Aliás pode dizer-se que o meu fantástico é mais real do que o real”.
A retrospectiva da obra de António de Macedo que a Cinemateca agora propõe é uma travessia de várias décadas de história do cinema português e a revisão de um olhar reivindicadamente experimental, frequentemente polémico. Numa proposta de António de Macedo, começamos por O PRINCÍPIO DA SABEDORIA, sendo a retrospectiva genericamente pensada a partir da sua cronologia. Incluindo longas e curtas-metragens, obras conhecidas e títulos mais raros, os filmes serão em grande parte apresentados em novas cópias tiradas no laboratório da Cinemateca. Será publicado um catálogo.»

terça-feira, 12 de junho de 2012

"A Conspiração dos Antepassados": excerto em 'spoken word'


 
Excerto em spoken word do meu romance A Conspiração dos Antepassados (Saída de Emergência, 2007). Neste trecho, o mago inglês Aleister Crowley retorna pelo espaço-tempo à Boca do Inferno, em Cascais, e é refeito depois de ter sido digerido em Daath pela força física Coronzon. Ao restabelecer-se, percebe que perdeu o paradeiro do poeta português Fernando Pessoa, que ficara à sua espera.

(Este vídeo faz parte de uma série de excertos em spoken word dos meus romances, que estou a publicar regularmente no meu canal de YouTube.)

sábado, 9 de junho de 2012

A Salta-Pocinhas de "Lisboa Triunfante"


«Dentro da caixa aberta sobre a mesa do escritório, a pedra começou a intrigar Paula cada vez mais; deixando os envelopes com os postais de lado ela ligou-se à Internet e procurou “pedras com buraquinhos” com a ajuda do Google. Não encontrou nada que se relacionasse com a pedra que comprara. Coçou a cabeça e fez uma nova busca por “pedras com covinhas”. Passou os olhos pelos resultados (1 – 10 de cerca de 7.810 para pedras com covinhas – 0,17 segundos) e carregou num novo separador a primeira página que lhe era aconselhada: um site sobre monumentos megalíticos. Surpreendida, procurou no texto as palavras que usara para proceder à pesquisa e que a aplicação Google Toolbar pintara de amarelo. Leu: «Conhecem-se igualmente cerca de uma centena de pedras com covinhas, monumentos misteriosos certamente relacionados com o megalitismo; com efeito, as covinhas surgem, frequentemente, gravadas nos próprios monumentos megalíticos.» Confusa, regressou à página dos resultados da pesquisa e procurou outro site que a pudesse esclarecer. Escolheu um link pertencente ao Instituto Português de Arqueologia e carregou um documento em formato pdf sobre monumentos pré-históricos. Observou as fotografias a preto e branco de menires e pedras com covinhas: numa das páginas encontrou uma imagem de uma peça como aquela que tinha a seu lado. Riu. Seria possível que tivesse comprado um artefacto pré-histórico por cento e cinquenta euros?
Comparou as duas pedras: a sua era mais estreita e mais pequena; as covinhas, também chamadas de pocinhas, espalhavam-se pela superfície negra num padrão mais intrincado e com variadas ligações entre elas feitas por sulcos finos e grossos. Paula passou o dedo pelas pocinhas e arregalou os olhos. Nunca tinha tocado em nada tão antigo, mas sentiu algo semelhante àquilo que experimentara há anos quando pegara ao colo o sobrinho acabado de nascer.
Que iria fazer?
Conservaria a pedra ou entregá-la-ia ao instituto?
Retirou-a da caixa com cuidado e estudou-a. Teria mesmo pertencido a Aquilino? Como é que ele ficara na posse de uma coisa daquelas?
Pousou a pedra no colo e procurou o significado das pocinhas. Descobriu que tinham muitos nomes: pocinhas, covinhas, buraquinhos, pucarinhos, cantinhos, malguinhas. Suspeitava-se que tivessem algum sentido religioso, mas, até à data, permaneciam um mistério. Guardou a pedra na caixa com reverência e ficou a olhar para ela, meditando no destino a dar ao artefacto. Não chegou a conclusão nenhuma e voltou a sentar-se para consultar as contas nos fóruns.

(...)

Quando olhou para os pés da cama viu que a Raposa ainda lá estava e gemeu. Começou a sentir medo. A Raposa apercebeu-se da perturbação dela e disse:
‘Não precisas de ter medo, Paula. Eu digo-te o que quero.’
A mulher ergueu a cabeça e abraçou-se; começou a esfregar as mãos nos braços como se estivesse com frio.
‘Tu tens uma coisa que é minha’, continuou a Raposa. ‘Eu preciso dela.’
‘O que é que eu tenho?’, balbuciou. Sentia a boca seca. Sentia vontade de ir à casa-de-banho.
‘A pedra das pocinhas’, disse a Raposa. ‘A minha pedra das pocinhas.’
‘Mas…’
Vai buscá-la.’
Paula levantou-se devagar e saiu do quarto. Demorou uns instantes e regressou amedrontada com a caixa nas mãos.
‘Muito bem’, disse a Raposa, caminhando em duas patas ao encontro dela. Paula parou com medo e, gritando, deu um passo atrás. ‘Não tenhas medo. Põe a caixa no chão e abre-a.’
Ela obedeceu e retrocedeu temerosa para dar espaço à Raposa. A criatura debruçou-se sobre a caixa aberta e retirou a pedra das pocinhas. Deu uma gargalhada vulpina e abanou a cauda.
‘Obrigado.’ Piscou o olho a Paula e sorriu até às pontas das orelhas.
‘O que é isso?’, perguntou ela.
Isto?’ Mostrou-lhe a pedra e agarrou-a debaixo do braço. ‘É uma cópia muito, muito antiga de uma coisa que me roubaram há muito, muito tempo.’ Fez uma pausa e concluiu: ‘É um mapa.’
‘Um m-mapa?...’ A curiosidade sobrepôs-se ao medo. ‘Um mapa de quê?’
‘De tudo aquilo que existe?...’, comentou a Raposa. Olhando embevecida para a pedra, respondeu: ‘De todos os mundos que existem.’
‘Todos… Todos os mundos?!...’
‘Todos, todos não!…’, disse a Raposa com ironia. ‘Alguns dos que aqui estão já não existem. Também faltam uns novos que, entretanto, eclodiram… Mas é um bom mapa.’
‘Isto…’ Paula sentou-se no chão e encostou-se à parede. Faltava-lhe o ar e sentia-se tonta. ‘Isto é demais para mim…’
‘Estas pocinhas, estás a vê-las?’
Aproximou-se indiferente à indisposição da mulher e mostrou-lhe a pedra; ela ficou chocada com o cheiro pungente da Raposa: cheirava como um animal verdadeiro.
‘São mundos. Universos… O que eu faço é usar este mapa para saltar de um mundo para outro mundo. Salto pocinhas!
Paula lembrou-se do nome da raposa de O Romance da Raposa.
Salta-Pocinhas.
«E se te disser que… que a Salta-Pocinhas me vem visitar… hoje?»
O medo começou a abandoná-la.
«A raposa das tretas.»
‘Onde… Onde é que está este mundo?’, perguntou Paula à Salta-Pocinhas.
«O mundo é feito de “tretas”. De sonhos e de mistérios. Cada coisa tem dentro dela um conto de fadas.»
‘Este universo?’ A Raposa meteu-lhe a pedra debaixo do nariz. ‘Ora… É esta pocinha aqui.’ Apontou com um dedo para um buraco minúsculo que estava ligado por um sulco fininho a outro muito maior.
Paula olhou para a pedra e não pôde deixar de sorrir; um sorriso ainda assustadiço.
‘É um universo tão pequenino…’
‘Ah! Tão pequeno quanto o segundo que demora a tirar uma fotografia? Muito bem visto!’»

(Excerto do meu romance Lisboa Triunfante. Saída de Emergência, 2008: http://www.saidadeemergencia.com/produto/-o-202345/-o-202346/lisboa-triunfante-edicao-da-raposa)

quinta-feira, 7 de junho de 2012

"Batalha": excerto em 'spoken word'



Excerto em spoken word do meu romance Batalha (Saída de Emergência, 2011). Neste trecho, Batalha, a ratazana, chega ao local de construção do Mosteiro de Santa Maria da Vitória e no seu espírito opera-se uma transformação.

(Este vídeo inaugura uma série de excertos em spoken word dos meus romances, que irei publicar regularmente.)

Perfil na Revista LER

O meu perfil na peça "De Que Falamos Quando Falamos Hoje de BD Portuguesa", escrita por Sara Figueiredo Costa para a Revista LER de Maio.


quarta-feira, 6 de junho de 2012

Excerto exclusivo de "Compêndio de Segredos Sombrios e Factos Arrepiantes"


Estão disponíveis na loja online das edições Saída de Emergência as primeiras sessenta páginas do meu novo livro Compêndio de Segredos Sombrios e Factos Arrepiantes: uma viagem erudita e surpreendente ao lado negro da História, da Ciência, do Oculto e do Bestiário.

Descubram, entre outras histórias terríveis, mas reais, qual foi o grifo do Infante D. Pedro, as origens do misterioso pentagrama, que propósitos sinistros serviram as rãs de Lavater, quem decorava a casa com figurinhas de porcelana Allach, os segredos por trás da cerimónia do Sabbath, o significado das gárgulas da catedral de Notre-Dame em Paris, o que é que nos faz tão influenciáveis à autoridade e a verdade histórica sobre as cruzes da Ordem de Cristo nas velas das caravelas portuguesas.
Todos os exemplares disponíveis na loja online da editora estão assinados.


História



Ciência



Oculto



Bestiário



segunda-feira, 4 de junho de 2012

Crióforo


Existem ligações evidentes entre a lenda grega de Hermes Krioforos (Hermes, o Portador de Carneiros), mais as suas representações clássicas (como esta cópia romana de uma estátua feita pelo escultor grego Calamis, no século IV a. C., pertencente à colecção do museu Barracco di Scultura Antica, em Roma), e a iconografia paleocristã que nos chegou datada do século II, na qual Cristo também surge como crióforo, mas traduzido para o significado paralelo de "Bom Pastor": o salvador do rebanho.
A partir do mesmo período, os cristãos primitivos foram instrumentais na popularização de textos religiosos organizados no feitio de códice: o comum formato de livro (em latim, a palavra homógrafa da qual a nossa descende tem origem no étimo caudex que significa tronco de árvore). O códice não é uma "evolução" do formato em volume, o tradicional rolo (da palavra latina voluminen que significa coisa enrolada), e ambos os formatos coexistiram durante muito tempo, destinando-se a finalidades distintas. E existe, de facto, uma diferença enorme entre ler um texto escrito num volume e ler um texto escrito num códice.

Somente a partir da difusão do conceito de códice (a palavra dex é um latinismo que só entrou na nossa língua na segunda metade do século XVIII) é que pode falar-se em leitura, no sentido contemporâneo. Não estou, pois, de acordo com a ideia de que os primitivos suportes de registo manuscrito, que podem ser traçados até à civilização suméria (ou a eras ainda mais pretéritas) fossem proto-livros: acho que consistiram em outras tecnologias, ao serviço de objectivos variados, como enumerar, contabilizar e anotar, mas não foram veículos para a leitura reflexiva e interpretativa como os códices vieram a tornar-se. É por esta razão que eu acho que a conversa de que o advento dos eReaders consiste num salto tecnológico da mesma ordem que aquele que se deu de prancheta para volume e de volume para códice e de códice manuscrito para livro impresso é uma arenga publicitária: a prancheta, o volume e o códice coexistiram, serviram diferentes propósitos e não podem ser observados como provenientes uns dos outros.

De modos inesperados, o imago crióforo relaciona-se completamente com o códice. Para começar, a criação do códice - do livro - não teria sido a mesma sem carneiros.
O uso da pele de carneiro como suporte para a escrita já era conhecido há muito tempo no mundo mediterrânico, mas foi na cidade grega de Pérgamo (na Turquia) que, no século II a. C., a manufactura de peles de carneiro (pergaminho), como alternativa ao papiro, ganhou uma grandeza e sofisticação inéditas até à data. Em síntese, o método artesanal para produzir pergaminhos era o seguinte: depois de esfolado o carneiro, a sua pele era mergulhada num recipiente cheio de água e cerveja para que ficasse limpa de impurezas e pêlos; em seguida, a pele era posta a secar ao Sol num estirador que a esticava com força. Quando a pele enrijecia, estava pronta para ser raspada (tradicionalmente com uma espécie de faca de lâmina semi-circular, que viria a ser chamada de lunellarium pelos romanos), branqueada e cortada.
Na Europa, a manufactura de papel (palavra que procede de papiro - com efeito, o papiro e o papel têm muitas semelhanças), feito de fibras vegetais, como linho e cânhamo, despontou principalmente na Península Ibérica durante a ocupação árabe (chegaram-nos livros árabes peninsulares, escritos em papel, e datados de finais do século XI), mas isso não afectou a indústria do pergaminho - nem sequer com o advento da imprensa de caracteres móveis, em meados do século XV, posto que imprimia-se em pergaminho. Mesmo assim, o papel depressa se popularizou, tornando-se um material cada vez mais barato - a mais antiga fábrica de papel da Península Ibérica, aproveitando para o efeito a força hidráulica, até já datava do primeiro decénio do século XV e ficava na cidade portuguesa de Leiria.

De maneira geral, os tamanhos padronizados de impressão de livros não mudaram muito: continua-se a imprimir em papel sob medidas influenciadas pelas dimensões proporcionadas pelas antigas peles dos carneiros que, ao serem retiradas dos estiradores, eram cortadas rectangularmente, de maneira a desbaratar-se as superfluidades correspondentes aos membros dos animais e obter-se uma prática superfície regular.
No mínimo, esse pergaminho rectangular podia ser dobrado ao meio até três vezes: à primeira, que oferecia duas folhas e quatro páginas, chamava-se folio (que deriva da palavra latina para folha - tinha esse nome, porque, de facto, era a primeira folha: o formato maior); à segunda, com a qual se obtinham quatro folhas e oito páginas, chamava-se quarto (a quarta parte); e a terceira, que oferecia oito folhas e dezasseis páginas, chamava-se octavo (a oitava parte). Os tipógrafos que assim o desejavam, imprimiam em pergaminho e em papel livros de tamanhos mais pequenos que o octavo (o duodecimo, por exemplo, que equivale às proporções de um actual paperback ou livro de bolso), mas só com a invenção das impressoras contemporâneas é que foi possível imprimir-se livros e outras publicações em tamanhos maiores que o carneiro mais corpulento, porque o papel, embora nada tivesse de animal, era cortado de acordo com essa bitola.
A maioria dos livros actuais é impressa em papel, mas as suas dimensões referenciam ainda aquilo que eu chamo de Ovina Proportione: todos os leitores são, por essa razão, Hermes Krioforos. (Como Hermes, na mitologia grega, é o deus da linguagem, assim como o inventor do alfabeto, acho que é um pensamento muitíssimo adequado.) 

A influência dos carneiros sobre o mundo dos livros não se esgota aqui. A própria palavra texto provém do étimo latino textu que significa tecido ou fios entrelaçados e que se usava, sobretudo, para designar a lã.
Na sua obra Instituto Oratoria (As Bases da Oratória), o filósofo e orador romano Quintiliano (século I) diz que é preciso escolher bem as palavras e entrelaçá-las num têxtil elegante e apurado. Muitas expressões relacionadas com a escrita ou com o acto de contar histórias correspondem-se com a lã e seus novelos (como «perder o fio à meada»).