quarta-feira, 15 de maio de 2019

A alegria de ir mais longe


"Enquanto uma geração se preocupar em exclusivo com o seu dever, que será a maior tarefa à qual se pode alcandorar, ela nunca se fatigará. Essa tarefa será sempre suficiente para a vida inteira. Quando um grupo de crianças em férias esgota por volta do meio-dia todas as brincadeiras que conhece e elas perguntam com impaciência, 'Quem é que sabe um jogo novo?', isso demonstrará que são mais desenvolvidas e capazes que outras crianças da sua geração, ou de gerações anteriores, que foram capazes de fazer durar o dia inteiro as brincadeiras que conheciam? Ou demonstrará que ao grupo faltava aquilo a que eu chamaria a rigorosa boa-fé no próprio acto de brincar?
A fé é o sentimento mais elevado num ser humano. Muitos em cada geração não chegarão tão longe, mas nenhuns irão para além dela. Se no nosso tempo existem ou não muitos que não a alcançam, é algo que deixo em aberto. Apenas posso referenciar a minha experiência, que é a de alguém que não faz segredo do facto que ainda tem muito para caminhar; sem, no entanto, desejar iludir-se, nem querer amesquinhar ao nível de uma futilidade ou de um delírio de criança — do tipo que se sana com urgência — aquilo que é mais elevado. (...)
'Há que ir mais longe, há que ir mais longe.' Já tem pergaminhos esta força maior de persistir."

(Søren Kierkgaard, Temor e Terror, 1843. Tradução minha. Imagem: Os Fazedores de Alegria, Carolus-Duran, 1870.)