sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Brincadeiras perigosas

O Fantástico está de volta: Brinca Comigo! e outras estórias fantásticas com brinquedos (Escrit´orio, 2009) estará disponível nas livrarias, a partir da próxima semana. Uma edição que promete dar que falar nos sapatinhos dos jovens leitores, neste Natal que aí se apressa. (A Escrit´orio consiste na nova casa das Edições Chimpanzé Intelectual; designação que, a partir desta edição, passa a ser o nome da colecção de literatura fantástica da editora supracitada.)

Trata-se de uma antologia composta por quatro contos, nos quais o elemento comum são os brinquedos; são, pois, histórias fantásticas com brinquedos, algumas bem negras, escritas por João Barreiros, João Ventura, Luís Filipe Silva e por mim: quatro histórias, quatro autores, quatro formas diferentes de olhar a literatura fantástica. Quatro boas razões para nunca mais passar a olhar para brinquedos da mesma maneira.

Brinca Comigo! teve o condão de fazer com que os seus autores regressassem aos tempos de infância para se lembrarem dos primeiros sustos que apanharam. Nessa óptica, as fotos que acompanham as biografias dos quatro cavaleiros do apocalipse são imagens deles enquanto petizes... A minha é esta:

Fãs de literatura fantástica, de horror ou, simplesmente, gente com curiosidade de ver como é que os autores eram, antes de crescer... a antologia Brinca Comigo! é para vocês.

O meu conto (com brinquedos e com vampiros) intitula-se Um Erro do Sol. Deixo-vos um excerto:

«Encontravam-se cercados por formações rochosas, matizadas de diversos tons de antracite; algumas camadas de rocha abriam-se em leque e exibiam nervuras e manchas que lhes emprestavam um aspecto de cauda de pavão. Sobre elas, altiva e acolchoada de neve, erguia-se a Crista. Não havia nada sobre a areia: nem detritos, nem pegadas de homens ou animais. Martin achou que a praia até parecia alcatroada. Tirando os óculos escuros, Surtr aproximou-se dele e perguntou:
‘O que é que quer fazer?’
O homem viu que os filhos tinham tirado as luvas e estavam a brincar com a areia. Karen vigiava-os.
‘Não sei’, respondeu Martin. Tirou os óculos escuros e inspirou fundo. ‘O que é que existe por trás disto?’, perguntou, apontando para os penhascos.
‘Pedras’, disse Surtr, pondo os óculos. ‘É igual a isto em todo o lado.’
‘Não existem… caminhos?’ Martin deu um passo em frente, olhando para as rochas como se quisesse ver através delas. ‘Uma estrada, talvez?’
‘Não há nada’, disse Surtr. ‘Mais valia estarmos na Lua.’
‘Na Lua?...’ Martin mordeu o lábio inferior. Foi ter com Karen e perguntou-lhe o que é que ela achava.
‘Agora que estou aqui, gosto’, disse ela, acenando com a cabeça. ‘Não é tão assustador como pensava.’
‘Sim, mas o que é que achas daquilo que o empregado da loja disse?’, perguntou Martin. ‘Achas que mora aqui alguém?’
‘Não sei, Martin’, respondeu a mulher, encolhendo os ombros. ‘Não parece um sítio habitável, mas sabe-se lá o que é que existe atrás disso.’
‘Olha, mãe’, disse Caroline em voz alta, apontando para o outro extremo da praia. ‘Focas.’
Karen virou-se e, ao longe, viu duas focas pretas a deslizar para dentro de água.
‘São duas foquinhas, amor’, disse ela, pondo-se de cócoras para ficar ao nível da filha.
‘Não’, disse Surtr, aproximando-se. ‘Duas, não.’ Fez uma pausa e acrescentou: ‘Dezenas.’
Martin pôs os óculos escuros graduados e, semicerrando os olhos, percebeu que naquele sítio a praia estava cheia de focas, mas como elas eram da cor da areia não tinha dado por elas. Não faziam barulho e mal se moviam.»

Nas livrarias a partir da próxima semana. (Em breve, divulgarei mais detalhes.)