quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Etimologias grevistas

Porque a palavra greve será, provavelmente, a mais ouvida neste dia, aqui fica um esclarecimento sobre a sua etimologia, recuperado de um verbete escrito a propósito do Dia do Trabalhador.

Consiste num contributo para a discussão sobre intervenção pública, neste dia de greve.
Somos animais de palavra: não no sentido moral, já anacrónico hoje em dia, infelizmente (esse sentido é só para quem ainda tem uma coisa chamada coluna vertebral), mas no modo instrumental da mesma, empregue em comunicação. Hoje, conhecer as palavras e o seu significado é, talvez mais do que em outras alturas, uma faculdade essencial para ser-se livre, inteligente e interventivo num mundo cada vez mais sintético, nanográfico e monossémico.

Costuma dizer-se que o étimo da palavra trabalho é o nome latino tripaliu: um popular instrumento de punição e tortura, que consistia num aparelho muito simples, formado pelo cruzamento de três estacas (duas montadas em feitio de cruz de Santo André e uma terceira atravessando na vertical a intersecção das outras). Os desgraçados amarrados ao tripaliu morriam incinerados. Por conseguinte, várias fontes são unânimes em explicar que o verbo trabalhar deriva de tripaliare, que significava pôr no tripaliu ou torturar no tripaliu. Eu tenho dúvidas que esta etimologia seja a correcta, mas talvez exista um modo de me reconciliar com ela: é que também se chamava tripaliu a um vulgaríssimo instrumento de trabalho rural, muito parecido com uma forquilha, que servia para atirar a colheita ao vento, de modo a separar as impurezas dos cereais. Ora, sendo que o trabalho rural é antiquíssimo e que o tripaliu do camponês foi um dos seus primeiros instrumentos, não me choca nada que ele tenha dado o nome a um posterior instrumento de tortura, também feito com três paus. Ou seja: talvez trabalho tenha mesmo origem no étimo tripaliu, mas por via do instrumento rural e não pela do de tortura.

À luz disto, é ainda curioso lembrar que as possíveis origens do Dia Internacional do Trabalhador talvez se encontrem no chamado Hayfair Massacre (Massacre do Mercado do Feno), ocorrido a 4 de Maio de 1886, em Chicago: uma greve acabou da pior forma possível, quando uma bomba lançada por um indivíduo anónimo teve como efeito um contra-ataque violento por parte da polícia.

Quanto à nossa palavra greve, ela tem origem na francesa grève, que significa areia ou gravilha. Até ao século XVIII, a famosa Place de l'Hôtel de Ville, à beira do Sena, em Paris, chamava-se Place de Grève. Era neste local que os trabalhadores à jorna se reuniam para serem contratados pelos mestres-de-obras que precisavam de braços. No entanto, quando os trabalhadores ficavam descontentes ou não gostavam do trabalho para o qual tinham sido contratados, retornavam à praça e aí ficavam até que os empreiteiros lhes oferecessem melhores condições ou que aparecessem outros biscates. Com o passar dos anos, o acto de "ficar em Grève" (ou seja, na Praça de Grève) transformou-se em "fazer greve" e "estar de greve".