sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Uma tarde no museu


Ontem, na companhia de um casal amigo, visitei o Museu Nacional da Arte Antiga para ver a exposição de pintura Primitivos Portugueses (1450-1550): O Século de Nuno Gonçalves, na qual se integram os trabalhos Painéis de São Vicente de Fora e Ecce Homo sobre os quais escrevi no romance O Evangelho do Enforcado (Saída de Emergência).

A minha intenção era começar a visita guiada pelo 3º andar do museu, dedicado à escultura, e onde se encontra a fantástica fonte bicéfala manuelina: um dos mais maravilhosos ícones da cidade.
Infelizmente, a exposição temporária ocupou o piso e as esculturas não podem ser observadas. Fiquei triste, porque queria mostrar a fonte aos meus amigos, mas haverá outra oportunidade. Entretanto, partilho uma imagem desse trabalho, de escultor anónimo e data incerta (datará do primeiro decénio do século XVI). Quantos outros trabalhos mágicos, desta natureza, teremos perdido ao longo dos séculos? Dá que pensar.

Aqui, D. Manuel I, o Venturoso, e provavelmente D. Maria (a sua segunda mulher, com quem casou em 1500), surgem como sendo as duas cabeças de uma serpente. Muito intrigante é a presença de dois brasões: a esfera armilar manuelina e o camaroeiro de D. Leonor, irmã mais velha do rei e viúva de D. João II.
Só existe mais um exemplo dessas duas empresas conjuntas e que é o Pelourinho de Óbidos. Por conseguinte, também se poderá especular que a cabeça feminina é a de D. Leonor.

Mesmo assim, D. Manuel I caracterizou-se por ser um rei que não teve amantes e por se fazer acompanhar por D. Maria em todas as ocasiões - conduta que não o poupou a que se dissesse em surdina que era um efeminado; já que, nessa altura, o costume mandatava que os mundos masculinos e femininos fossem duas realidades apartadas. Todavia, mesmo que a parcela feminina da enigmática escultura não seja D. Maria, isso não invalida o facto de que D. Manuel I e D. Maria deram feitio na vida diária a um verdadeiro rebis...