Agora
que foi anunciado na comunicação social que, em substituição do
plástico, os sacos de supermercado para alimentos frescos, como fruta,
legumes e pão, vão passar a ser feitos de leite (ou, em maior rigor, de
fibras de caseína, a proteína desse soro) vale a pena lembrar que essa
ideia não só não é nova (foi inventada há cem anos) como foi um dos
projectos considerados mais revolucionários pelo governo fascista italiano de Mussolini — inclusive, celebrado por Marinetti no futurista Poema do Vestido de Leite.
Para simplificar o discurso, de molde a não obstaculizar a estranheza de todo este conteúdo que, provavelmente, será uma novidade para quem não conhece a história do século XX — e a história do Fascismo, em principal —, sintetize-se desta forma: depois de a Itália ter invadido a Etiópia, a Liga das Nações decidiu castigá-la com sanções, mas o desvínculo dessa medida por parte de alguns países não provocou o efeito desejado; porém, foi um sinal claro o suficiente para que Mussolini apanhasse um susto e, consequentemente, concebesse uma grande campanha de produção manufactureira e industrial italiana totalmente auto-suficiente — ora, uma das áreas em que o conceito poderia ser mais fácil de aplicar era, à partida, a dos têxteis. Foi aqui que a ideia fascista da autarkia ("auto-suficiência"), como era designada no programa político, se conjugou com o espírito revolucionário fascista (o Fascismo foi um movimento revolucionário de Direita): o de criar um material-novo para uma sociedade nova.
Nessa perspectiva, os tecidos feitos de leite — tecnologia criada em Itália no início do século XX — consistiam numa solução atractiva, pois permitiam que Mussolini fosse ao encontro desses dois desideratos. A companhia criada para a produção desse novo e tão italiano material foi a Snia Viscosa, enquanto que à lã de leite se chamou Lanital (portmanteau feito da fusão das palavras lã e Itália). No poster propagandístico que publico abaixo pode ver-se dois grupos da Juventude Fascista, de Balillas e Piccole Italiane, a puxar em sentido contrário um fio de Lanital para comprovar a força do tecido e a união que este cumpria na nação, aqui representada pelas crianças: os homens e mulheres do Amanhã e o material do Amanhã.
Não obstante o entusiasmo e a propaganda (e as vendas internacionais para a Alemanha e a Inglaterra), a experiência Lanital não surtiu os resultados previstos (o material não era muito resistente, o que limitava o âmbito da sua introdução no mercado e, em certos casos, tinha tendência para cheirar mal) e foi sendo abandonada. Isso não impediu, todavia, que continuasse a ser desenvolvida em diferentes contextos, já no pós-II Grande Guerra.
Não deixa de ser tentador observar que a aparente obsessão hodierna com a alegada perigosidade de alguns tipos muito específicos de indústrias, como, neste caso, a do plástico, foi encontrar resposta salvífica num material que já os antigos fascistas haviam rotulado de revolucionário — e que, acrescente-se, continua a não ser "verde" (ou vegan), pois é feito de leite.
Para simplificar o discurso, de molde a não obstaculizar a estranheza de todo este conteúdo que, provavelmente, será uma novidade para quem não conhece a história do século XX — e a história do Fascismo, em principal —, sintetize-se desta forma: depois de a Itália ter invadido a Etiópia, a Liga das Nações decidiu castigá-la com sanções, mas o desvínculo dessa medida por parte de alguns países não provocou o efeito desejado; porém, foi um sinal claro o suficiente para que Mussolini apanhasse um susto e, consequentemente, concebesse uma grande campanha de produção manufactureira e industrial italiana totalmente auto-suficiente — ora, uma das áreas em que o conceito poderia ser mais fácil de aplicar era, à partida, a dos têxteis. Foi aqui que a ideia fascista da autarkia ("auto-suficiência"), como era designada no programa político, se conjugou com o espírito revolucionário fascista (o Fascismo foi um movimento revolucionário de Direita): o de criar um material-novo para uma sociedade nova.
Nessa perspectiva, os tecidos feitos de leite — tecnologia criada em Itália no início do século XX — consistiam numa solução atractiva, pois permitiam que Mussolini fosse ao encontro desses dois desideratos. A companhia criada para a produção desse novo e tão italiano material foi a Snia Viscosa, enquanto que à lã de leite se chamou Lanital (portmanteau feito da fusão das palavras lã e Itália). No poster propagandístico que publico abaixo pode ver-se dois grupos da Juventude Fascista, de Balillas e Piccole Italiane, a puxar em sentido contrário um fio de Lanital para comprovar a força do tecido e a união que este cumpria na nação, aqui representada pelas crianças: os homens e mulheres do Amanhã e o material do Amanhã.
Não obstante o entusiasmo e a propaganda (e as vendas internacionais para a Alemanha e a Inglaterra), a experiência Lanital não surtiu os resultados previstos (o material não era muito resistente, o que limitava o âmbito da sua introdução no mercado e, em certos casos, tinha tendência para cheirar mal) e foi sendo abandonada. Isso não impediu, todavia, que continuasse a ser desenvolvida em diferentes contextos, já no pós-II Grande Guerra.
Não deixa de ser tentador observar que a aparente obsessão hodierna com a alegada perigosidade de alguns tipos muito específicos de indústrias, como, neste caso, a do plástico, foi encontrar resposta salvífica num material que já os antigos fascistas haviam rotulado de revolucionário — e que, acrescente-se, continua a não ser "verde" (ou vegan), pois é feito de leite.