Este assunto foi analisado pelo historiador norte-americano Robert Darnton no livro The Great Cat Massacre, and Other Episodes in French Cultural History (1984), onde se conclui que o caso, embora revestido de um certo sentimento de reprovação da parte dos desgraçados jornaleiros contra o patrão endinheirado, consistiu mais num acontecimento simbólico que numa proto-rebelião, à guisa de Revolução Francesa avant la lettre. Pese o truísmo de que os servos sempre desprezaram, em menor ou maior grau, os amos, os protestos sociais do Ancien Régime mantiveram-se sempre ao nível do "simbólico", pois a consciência de que seria possível a criação de outro sistema político, igualitário, era inexistente. Com efeito, o próprio Darnton, em The Great Cat Massacre, avança com a ideia de que a grande satisfação das classes mais desfavorecidas da Idade Moderna consistiu na humilhação das classes superiores, mas não na abolição destas. O desenvolvimento do massacre dos gatos na Rue Séverin só foi possível porque a tortura e morte ritual de gatos era já uma prática predominante; em principal, nas festas de São João Baptista, em que os infelizes felinos eram incinerados vivos em fogueiras quasi-inquisitoriais. Para tal, concorreram, de certeza, as crenças populares nas supostas aptidões dos gatos para fazerem mal ou as suas alegadas associações a práticas de bruxaria. Com base em diversos elementos causadores, interligados com religião e superstição, o gato foi seleccionado com especificidade como sendo um animal expiatório - e quando o senhor Séverin, mais a esposa, pediram aos empregados Jerome (Contat) e Léveillé que se livrassem dos gatos vadios que não os deixavam dormir com os seus miados incessantes, os dois aprendizes de tipógrafo decidiram realizar a tarefa ao estilo das copies que animavam os seus dias na oficina.
Carnavalescas, as copies eram arremedos de boçais peças teatrais com happenings, improvisadas com ruído e gargalhadas pelos tipógrafos e representadas, posteriormente, em repetidas vezes (daí chamarem-se copies) na oficina durante as horas de trabalho. Serviam, de igual maneira, como uma espécie de mnemónicas da própria cultura da compagnonnage tipográfica, que também estava sujeita a práticas de iniciação, promoção e julgamento: apesar de trabalhar com a palavra impressa, a "ordem" dos aprendizes e tipógrafos jornaleiros possuía uma distintiva cultura oral, associada à desordem, ao escárnio e à fête, manifestada em partidas e brigas nas tabernas e nas ruas.
Ora, foi o encontro da cultura oral dos tipógrafos jornaleiros (que, mais do que sentirem fidelidade para com a sua "classe social", mantiveram fortíssimos laços de fidelidade entre a sua classe profissional - à semelhança dos restantes ofícios da cidade), a cultura das brincadeiras ruidosas das copies, com a cultural popular predominante, aprovadora da morte festiva e cerimonial de gatos, que permitiu o Grande Massacre dos Gatos: o enforcamento destes foi, pois, inspirado nos julgamentos ritualísticos ensaiados nas copies.
Adstringido no espaço e no tempo, o Grande Massacre dos Gatos não manifestou nenhum descontentamento social generalizado, nem nasceu no seio de uma rebelião. Foi um fenómeno sub-cultural, complexo, é certo, mas simbólico em vez de ser político.
O mais cómico é que, no melhor estilo truculento das copies, foi Contat quem subiu durante noites seguidas ao telhado dos aposentos do patrão e se pôs a imitar um gato, para não o deixar dormir.
Imagem: First Stage of Cruelty, William Hogarth (1751). Primeira gravura de uma tetralogia que demonstra, em registo satírico, a violência popular (e não só) de um típico bairro do Norte de Londres: St. Giles.