quarta-feira, 4 de abril de 2018

A morte é um órgão em nós contido


Como a espelta está para o trigo, está o virtual para o orgânico: morre-se de morte natural, diz a merologia — mas haverá outra morte que não seja natural? Orfeica? Essa ubiquitária trave-mestra da vida, somente sondável por quem dela se aproxima; prásina que anuncia a corrupção da carne. Ela é o tanque para o qual a alma é despejada — e ambas são animaculares, infinitesimais. Fulminígera, a sepultura arenga-nos como a candeia às traças: luz tão espessa e rescendente como xarope — e igualmente peganhosa. Nela nos funestamos, apaixonados pelo fedor solitário da nossa dissolução, identidade odorifumante que é ainda mais nossa que o coração: gosta-se do cheiro da própria morte; um cheiro que não faz impressão (de tão particular). Tão íntimo. É o cheiro de um órgão secreto e secretício que contemos sem detectação: a Finitude.