A repugnante Estanqueira do Loreto é outra das personagens principais de Os Anormais: Necropsia De Um Cosmos Olisiponense, o meu novo disco de spoken word, com texto e voz meus e música de Charles Sangnoir (La Chanson Noire).
Dona de um estanco setecentista (hoje diz-se tabacaria) construído nos insalubres Casebres do Loreto (as ruínas do Palácio dos Marqueses de Marialva, outrora situadas no local onde hoje se encontra a Praça Luís de Camões), a deformada Estanqueira foi alvo das partidas e das chacotas cruéis da populaça e dos poetas, acabando a vida no vizinho Largo do Calhariz, no início do século XIX, em condições miseráveis de desumanidade. Em meados desse século, a Estanqueira já adquirira aura de criatura lendária e tornou-se, até, ícone de produtos relacionados com o negócio do estanque, como comprova a pintura da tampa de uma caixa de rapé que pertenceu ao rei D. Pedro V e que se encontra na imagem acima.
Em Os Anormais: Necropsia De Um Cosmos Olisiponense, a desfigurada Estanqueira do Loreto é a Lua desse universo composto por indivíduos marginalizados: antropomórfica pietra del paragone que, entre a escória dos Casebres do Loreto, revela-nos o verdadeiro ouro oculto na nossa alma.
Nesta ligação, na qual o disco se encontra à venda, poderão ouvir o capítulo A Lua do Loreto: http://necrosymphonic.bandcamp.com/track/a-lua-do-loreto
A apresentação de Os Anormais: Necropsia De Um Cosmos Olisiponense será na próxima sexta-feira, dia 28, às 19H30, na Biblioteca Municipal Camões: lugar preenchido de significado, pois situa-se no Largo do Calhariz, onde a Estanqueira do Loreto terminou os seus dias.
Marquem nas vossas agendas, passem a palavra e apareçam: Charles Sangnoir tocará ao vivo, num lindíssimo piano oitocentista, enquanto eu, numa sessão de necropsia psicogeográfica, interpretarei A Lua do Loreto, em memória da Estanqueira e de todos os "anormais" que viveram em Lisboa.