O novo livro da romancista e filósofa norte-americana Rebecca Newberger Goldstein (mulher do cientista norte-americano Steven Pinker) intitula-se Plato at the Googleplex e consiste numa séria apologia sobre a pertinência da filosofia nos dias de hoje, pese os libelos dos seus detractores.
Considero que o debate sobre a vida útil da filosofia é, no mínimo, uma perda de tempo e, em maior espessura, aviltante para o pensamento, de modo geral, mas, no limite, será mais uma manifestação da radical instrumentalização de objectos e indivíduos sob a qual vivemos neste período que denomino de neo-romano e cuja raison d'être é, somente, o materialismo mais elementar possível. Ouve-se em vários momentos de horário nobre os esfervelhos anticonhecimento declamarem o dogma do utilitarismo e percebe-se como todo o edifício do saber é por eles grafitado com slogans pesporrentes que rotulam de sobejo tudo o que não for, imediatamente, convertido em ouro e prata - como a filosofia, olhada como um dos exemplos mais cristalinos da inutilidade intelectual, trincanfiada numa qualquer torre de marfim sem prestar nenhum serviço directo (e indirecto) aos jovens candidatos a empreendedores que desenvolvem bric-à-brac como o Spread It.
É por razões desta natureza que, hoje, livros como Plato at the Googleplex são tão importantes, embora valha a pena aproximarmo-nos com cautela deste tipo de alegorias platónicas, já que, há poucas décadas, outros pensadores recolheram a figura espadaúda de Platão (que, em grego, significa, literalmente, espadaúdo) para criarem livros de valor desigual entre si. Um dos mais interessantes, e que justamente resgato do oblívio alfarrábio em virtude de algumas semelhanças de metodologia que demonstra para com o livro de Goldstein (Platão observa com algum espavento o nosso presente), é o ensaio semi-satírico Plato Today, do escritor e político inglês Richard Crossman, responsável por iniciar no seio de correntes determinísticas entre historiadores (como o determinismo moderado do anglo-austríaco Karl Popper e do anglo-russo Isaiah Berlin) a ideia de que Platão foi o primeiro fascista, pai espiritual de Mussolini e Hitler.
São duas leituras que recomendo, chamando a atenção para o facto de que estarmos, hoje, neste momento, a falar sobre a actualidade da filosofia, prova que ela está longe do estádio moribundo ou até cadaverizado para o qual querem desterrá-la. Chamo, de igual modo, a atenção para o facto de que, hoje, o pensamento filosófico tem necessariamente de acompanhar de muitíssimo perto o progresso científico, nas suas múltiplas áreas, se quiser manter o gume, como tenho escrito várias vezes aqui nos Cadernos de Daath: hoje, como ontem, filosofar sem conhecer ciência é um erro. Não é à toa que os primeiros cientistas começaram por chamar-se filósofos naturais.