A mesa redonda subordinada às relações entre os autores e os críticos de banda desenhada, mais as possíveis tendências às quais a nona arte se poderá moldar daqui as uns tempos, e que decorreu hoje à tarde da Bedeteca de Lisboa, correu bastante bem; as intervenções dos oradores, incluindo eu, pautaram-se pela energia e acutilância. Agradeço à Bedeteca (Rosa Barreto, Marcos Farrajota, Adalberto Barrreto) o convite que me endereçou para participar.
Depois da exposição de ideias, eu e os meus colegas de debate tivemos o privilégio de usufruir de uma visita guiada à exposição Os Ridículos: Desenho Humorístico e censura (1933-1945): iniciativa conjunta entre a própria Bedeteca e a Hemeroteca Municipal de Lisboa, que estará presente no Palácio do Contador-Mor, até 31 de Dezembro.
A exposição conta com dezenas de originais pertencentes ao espólio constituido pelos exemplares do bissemanário satírico Os Ridículos, periódico dirigido por José Maria da Cruz Moreira, o "Caracoles", e que começou a ser publicado em 1895. Stuart de Carvalhais, Natalino Malquiades, Santos Silva, Colaço ou Xavier Magalhães são apenas alguns dos ilustradores cujos trabalhos, censurados pelos infames lápis-azuis dos censores do Secretariado de Propaganda Nacional de António Ferro (1933), mais tarde Secretariado Nacional de Informação, Turismo e Cultura Popular (1944), podemos agora admirar sem qualquer repreendimento ou risco.
É preciso lembrar, ou mesmo ensinar, aos mais distraídos que, já em 1932, Salazar declarou que a revolução legal estava realizada, mas que faltava concluir a revolução mental. Para o efeito, criou o conceito de política do espírito: espírito esse que orientou a propaganda do regime que ficou a cargo de Ferro e Álvaro Salvação Barreto.
Os objectivos censórios de qualquer sistema político totalitário são sempre veicular a receita desse mesmo regime, apelar à apatia dos cidadãos mediante um retrato anódino do quotidiano e fazer-lhes acreditar numa visão monoteísta do mundo, da qual o líder aparece como grande farol. Se é verdade que os gabinetes de Ferro e Barreto eram independentes (o SNP e a Censura), ambos faziam parte do mesmo tronco e lucraram mais ainda com a sua fusão, em 1944, quando o SNI sucedeu ao anterior organismo. O escritor espanhol Eugénio D'Ors escreveu no prefácio do livro Salazar: O Homem e a Sua Obra, de António Ferro (Edições Fernando Pereira. Aveiro, 1982) que o aparelho da Censura foi «o preservativo do Velho Regime».
Ora, como preservativo entenda-se aqui não só o significado de agente preventivo, mas também de composto conservador de um estado ideal de higiene. Não foi à toa que Salazar disse que «se o jornal é o alimento espiritual do povo, deve ser fiscalizado como todos os alimentos».
A exposição que devem visitar na Bedeteca de Lisboa até ao final do ano é uma amostra significativa, e lúcida, daquilo que foi o ministrium dos censores do Estado Novo.
É comissariada por Álvaro Costa de Matos (Hemeroteca Municipal de Lisboa) e Pedro Bebiano Braga (Museu Rafael Bordalo Pinheiro): fica o agradecimento pelo tempo que concederam à visita guiada que nos realizaram.
Depois da exposição de ideias, eu e os meus colegas de debate tivemos o privilégio de usufruir de uma visita guiada à exposição Os Ridículos: Desenho Humorístico e censura (1933-1945): iniciativa conjunta entre a própria Bedeteca e a Hemeroteca Municipal de Lisboa, que estará presente no Palácio do Contador-Mor, até 31 de Dezembro.
A exposição conta com dezenas de originais pertencentes ao espólio constituido pelos exemplares do bissemanário satírico Os Ridículos, periódico dirigido por José Maria da Cruz Moreira, o "Caracoles", e que começou a ser publicado em 1895. Stuart de Carvalhais, Natalino Malquiades, Santos Silva, Colaço ou Xavier Magalhães são apenas alguns dos ilustradores cujos trabalhos, censurados pelos infames lápis-azuis dos censores do Secretariado de Propaganda Nacional de António Ferro (1933), mais tarde Secretariado Nacional de Informação, Turismo e Cultura Popular (1944), podemos agora admirar sem qualquer repreendimento ou risco.
É preciso lembrar, ou mesmo ensinar, aos mais distraídos que, já em 1932, Salazar declarou que a revolução legal estava realizada, mas que faltava concluir a revolução mental. Para o efeito, criou o conceito de política do espírito: espírito esse que orientou a propaganda do regime que ficou a cargo de Ferro e Álvaro Salvação Barreto.
Os objectivos censórios de qualquer sistema político totalitário são sempre veicular a receita desse mesmo regime, apelar à apatia dos cidadãos mediante um retrato anódino do quotidiano e fazer-lhes acreditar numa visão monoteísta do mundo, da qual o líder aparece como grande farol. Se é verdade que os gabinetes de Ferro e Barreto eram independentes (o SNP e a Censura), ambos faziam parte do mesmo tronco e lucraram mais ainda com a sua fusão, em 1944, quando o SNI sucedeu ao anterior organismo. O escritor espanhol Eugénio D'Ors escreveu no prefácio do livro Salazar: O Homem e a Sua Obra, de António Ferro (Edições Fernando Pereira. Aveiro, 1982) que o aparelho da Censura foi «o preservativo do Velho Regime».
Ora, como preservativo entenda-se aqui não só o significado de agente preventivo, mas também de composto conservador de um estado ideal de higiene. Não foi à toa que Salazar disse que «se o jornal é o alimento espiritual do povo, deve ser fiscalizado como todos os alimentos».
A exposição que devem visitar na Bedeteca de Lisboa até ao final do ano é uma amostra significativa, e lúcida, daquilo que foi o ministrium dos censores do Estado Novo.
É comissariada por Álvaro Costa de Matos (Hemeroteca Municipal de Lisboa) e Pedro Bebiano Braga (Museu Rafael Bordalo Pinheiro): fica o agradecimento pelo tempo que concederam à visita guiada que nos realizaram.