O meu novo livro de contos de horror, 
A Luz Miserável (
Saída de Emergência), está quase a sair e será apresentado em exclusivo no próximo 
Fórum Fantástico. Até lá, lembro dez livros de horror que qualquer fã do género deveria ler.
Books of Blood, Clive Barker
Partindo de uma premissa que faz lembrar 
The Illustrated Man, de Ray  Bradbury, o carnaval horrível que Barker nos apresenta nestes livros é,  provavelmente, o melhor exemplo que temos sobre o 
Horror  como 
gerador de diversidade. Enquanto bestiário é riquíssimo e enquanto  exercício literário é poderoso. Depois da sua publicação, Barker já  escreveu melhor, no que alude ao estilo e à forma, mas 
Books of  Blood continua intocável. É o trabalho de um escritor único no topo dos  seus poderes criativos.
Histoires Désobligeantes, Léon Bloy
Em 
La Femme Pauvre, publicado em língua portuguesa pela Ulisseia, Léon  Bloy diz-nos pela voz do narrador: 
«O autor nunca prometeu divertir  ninguém. Prometeu muitas vezes o contrário e cumpriu fielmente a sua  palavra.» É a 
tagline perfeita para caracterizar 
Histoires  Désobligeantes. Pequenos contos sórdidos, sempre entre a imundície e a  redenção, escritos com uma espécie de realismo simbólico em mente.  Escamoteada a carapaça de lixo que envolve estas histórias,  testemunhamos o talento literário de um autor incisivo e,  surpreendentemente, optimista. Possui uma linha de diálogo que poderia  servir para cartão de visita da ficção de 
horror: 
«O meu amor por ti tem tenazes de caranguejo!» Macabro e com muito humor negro.
Swastika Night, Katharine Burdekin
Livro  terrível sobre um mundo nazi onde os homens são educados para serem  soldados brutais e as mulheres estão reduzidas ao estatuto de gado  parideiro. A Europa de 
Swastika Night vive a Era de Hitler, sete séculos  depois da morte do ditador, agora adorado como uma divindade que nasceu  da cabeça do próprio Deus do Trovão – logo despoluído do contacto com  carne feminina. Escrito durante a consolidação dos regimes fascista na  Itália e nacional-socialista na Alemanha, antes da Segunda Grande Guerra, este é um  livro no qual Burdekin expande as ideias misóginas dos discursos de  Hitler para criar um pesadelo insuportável. É preciso compreender que,  naquele momento, não se sabia se os nazis iriam perdurar ou não e o temor de uma iminente ocupação global era sentido à flor da pele  por todos aqueles que não simpatizavam com as ideias do 
III Reich. Mas  por mais assustador que o livro de Burdekin seja, a realidade foi muito  mais temível: Hitler esterilizou em segredo milhares de alemães durante  os anos em que foi chanceler; e se as medidas eugénicas não alcançaram o  resultado esperado foi graças às substâncias e métodos envolvidos:  chumbo, raios-X e até alguns venenos feitos com plantas da América do  Sul. Na sua ideia, somente oficiais nazis seriam autorizados a procriar e  para isso criou centenas de bordéis onde as suas altas patentes, em  verdadeiras linhas de montagem, engravidavam prostitutas, voluntárias e adolescentes raptadas. Eram as chamadas 
Lebensborn: as 
Fontes  da Vida.
The Night Land, William Hope Hodgson
Estranhíssimo romance sobre um futuro longínquo em que o Sol morreu e os poucos sobreviventes da espécie humana, que não se cruzaram geneticamente com alienígenas, resistem aos ataques insondáveis de leviatânicas criaturas inescrutáveis dentro de um refúgio piramidal. Às tantas, um deles tem uma visão de que existem mais sobreviventes humanos noutro local e um grupo sai para o exterior com o objectivo de encontrá-los. Para o gosto contemporâneo, a prosa de Hodgson é pesada - e deliberadamente artificial, já que o narrador é, supostamente, um indivíduo do século XVII -, mas àquilo que lhe falta em estilo, 
Night Land compensa em imaginação e invocação de 
impending doom. Um romance 
underrated que merece ser mais conhecido.
The Monk, Matthew Lewis
Epítome da verdadeira literatura gótica e muito provável 
blueprint para o horror contemporâneo, 
The Monk tem de tudo: incesto, violação, satanismo, homossexualidade e tortura. O (bom) equivalente literário de um 
torture porn setecentista, escrito com um estilo endiabrado e refinado. Existe uma edição recente em português pela Bonecos Rebeldes.
La Luna e il Falò de Cesare Pavese
Último  romance do escritor e poeta italiano Cesare Pavese, publicado em 1950,  poucos meses antes do autor se suicidar. 
La Luna e il Falò é o relato simbólico do trágico regresso a casa de Enguia,  personagem principal que decide voltar à terra natal, a região rural  de Langhe, após ter feito vida nos Estados Unidos. Mas o que  Enguia encontra não o reconforta e, na companhia de Nuto, o seu melhor  amigo de infância, mergulhará numa crescente depressão, fortalecida pela  melancolia que as searas desertas e os campos abandonados lhe provocam.  Romance alegórico, inquieto, quente, de uma ilusória simplicidade e cujo  final não trará nenhuma reconciliação a Enguia. E nós, leitores  angustiados, descobriremos que as fogueiras a que o título alude podem  ter diversos significados.
La Tour d'Amour, Rachilde.
Rachilde foi o pseudónimo de Marguerite Vallette-Eymery, autora  integrada no Movimento Decadente, no qual figuram artistas tão diversos  como Isidore Ducasse (Conde de Lautréamont.), Joris-Karl Huysmans ou o  pintor Franz Stuck. 
La Tour d'Amour é uma história de travestismo e  necrofilia, passada num farol isolado na costa de França, cujas  personagens principais são Mathurin Barnabas, o faroleiro que pesca  corpos destroçados dos escolhos para os usar nas suas sevícias, e  Jean Maleux, o jovem aprendiz, simultaneamente repugnado e seduzido  pela conduta do velho mestre. Numa sequência inesquecível, Rachilde  conta-nos que Barnabas guarda uma cabeça decepada, em avançado estádio  de decomposição, para se masturbar: jogos mais arrojados que as púdicas  brincadeiras de 
Herbert West: Reanimator, de Lovecraft — e escritos por  uma mulher no último ano do século XIX. Ambiente gótico sem folhos e com  profanação de cadáveres.
Frankenstein,
 Mary ShelleyFrankenstein  não é o nome da criatura feita de pedaços de cadáveres, mas o do seu  criador. É engraçado descobrir que o monstro de Frankenstein é um homem  sensível e bem falante (quando não lhe chega a mostarda ao nariz, pelo  menos…), enquanto que as adaptações teatrais e cinematográficas o  transformaram num golem imbecil e trapalhão: a imagem mais conhecida do  monstro de Frankenstein, com a testa alva, cabelo oleoso e  eléctrodos no pescoço, deve-se a James Whale e Jack Pierce, realizador e  caracterizador que trabalharam na primeira adaptação cinematográfica  desta história, e não se parece em nada com aquilo que o livro nos apresenta. Neste, o monstro aprende a ler com os grandes clássicos da  literatura (encontrados num baú abandonado) e a falar inglês de ouvido.  Tudo o que quer é encontrar o seu lugar no mundo e que Frankenstein o  reconheça como humano. Mais tarde, o monstro assume a sua condição maldita, mas exige que Frankenstein lhe faça uma companheira que o  acompanhe no exílio. A casmurrice do cientista terá consequências  terríveis.
Na minha opinião, o final do livro, passado no deserto gelado do Pólo Norte, faz de 
Frankenstein a obra de transição entre um 
horror clássico e naturalista e o moderno 
horror  interior.
Dr Jekyll and Mr Hyde, Robert Louis Stevenson
Toda  a gente conhece o livro 
Dr Jekyll and Mr Hyde, seja por o ter lido ou  visto alguma das suas diversas adaptações cinematográficas, mas poucos  leitores devem saber que Stevenson já tinha escrito, dois anos antes da  publicação desse título, uma peça de teatro intitulada 
Master Brodie, or The Double Life. Escrita em parceria com William Henley, a peça conta  uma história baseada na vida real de um criminoso escocês chamado  William Brodie, que vivera um século antes. Maçon, cavalheiro respeitado  na sua comunidade, Brodie escondia uma natureza turbulenta sob a pele  da diplomacia e entregava-se em segredo ao roubo e ao jogo. Mr Hyde é,  largamente, mais violento que aquilo que Mr Brodie poderia alguma vez  ter sido, mas foi a dualidade do segundo que inspirou Stevenson a  escrever a peça e, posteriormente, a criar a figura miserável do Dr  Jekyll. Hyde começa por ser um anão simiesco, traquinas, mas à  medida que Jekyll lhe vai dando rédea solta ele transfigura-se num  musculado monstro assassino. Um clássico simbólico, por excelência.
Ghost Story, Peter Straub
Quem estiver à procura de algo que pudesse ter sido escrito por M. R.  James ficará confuso: 
Ghost Story não é uma história de fantasmas. No mínimo, no sentido tradicional. Na verdade, nem sei definir o que é. História de vingança além-túmulo? Compêndio impressionante de todos os  elementos da ficção de 
horror num  microcosmos de quinhentas e cinquenta páginas, 
à la The Monk, de Matthew  Lewis? Revisão moderna de 
The Great God Pan, de Arthur Machen? Não nos  vamos preocupar com definições. A prosa de Straub é arisca e o  início do livro é exigente; contudo, assim que as personagens nos são  apresentadas, 
Ghost Story transforma-se num verdadeiro 
page turner. Muito interessante.