quarta-feira, 29 de junho de 2011

A Árvore da Vida

Antes de entrar na sala de cinema não sabia o que esperar do filme The Tree of Life, de Terence Malick, e depois de ter saído ainda não sei se gostei ou não. Em última análise, apesar de preocupar-se com o cósmico e com o microscópico, The Tree of Life estaciona confortavelmente a meia-escala: não é a obra-prima que por aí andam a anunciar, mas também não é tão mau quanto o pintam.
O filme é, em essência, sobre criação - em todos os sentidos da palavra, desde os mais pragmáticos aos mais filosóficos. Por um lado, as personagens reflectem sobre a sua relação (sempre falhada) com Deus e questionam os modos como Ele, supostamente, se manifesta no mundo. Por outro, a personagem interpretada por Brad Pitt, um patriarca austero, mas justo, inventor prolífico e músico fracassado (todavia, talentoso), apresenta-se como um reflexo microscópico do Deus cósmico que também inventou muita coisa, desde criaturas e os seus elementos químicos constituintes, e ainda orquestra a chamada "música das esferas" - visões patenteadas em fabulosos planos, realizados sem recurso a CGI, o que é ainda mais espantoso. Contudo, pelo menos para a minha sensibilidade, o caleidoscópio de imagens, cores e texturas oferecido por The Tree of Life não me encantou como se calhar deveria: fosse o texto de outra cepa e o consórcio da palavra com a imagem que o filme tenta cumprir seria de excelência. Contudo, existe aqui um inegável sentido artístico - um poderoso sentido do belo - que é completamente autoral e, nesse sentido, auto-referencial, feito de ideias que Malick já demonstrou em filmes anteriores, como The Thin Red Line: nesse filme, borboletas tumultuam entre soldados aos tiros uns aos outros; e em The Tree of Life uma libélula hesita entre uma multidão de miúdos assombrados por um colega que morre afogado numa piscina.
É com base em detalhes deste jaez que tenho dificuldade em perceber qual é a postura de Malick diante do divino. É crente? É ateu? É agnóstico? O certo é que o filme sabe bastante a ementa born again, sentimento reforçado por alguns trechos muito ilustrativos, mas, sob outro ponto de vista, talvez só as personagens sejam verdadeiramente crentes e o filme possua um pathos ateísta: exemplificado em maior espessura na sequência da morte do Sol. O segmento do impacto do asteróide que destrói os dinossauros e que antecede o relato da vida das personagens humanas faz lembrar a cena de 2001: A Space Odyssey, de Stanley Kubrick, em que o antropóide joga o osso ao ar e, de repente, ele transforma-se numa nave espacial, mas o efeito não tem um virtuosismo análogo. Porém, é provável que seja essa a óptica pela qual este filme deva ser entendido: um épico metafísico, com todo o abstractismo que isso carrega, sobre criação e as relações que existem entre o infinitamente grande e o infinitesimalmente pequeno. É um filme inteligente e que exige pensamento da parte do espectador (todos os filmes deviam exigi-lo, mas, enfim, já se aprendeu que cabe sempre a excentricidades da espécie de The Tree of Life lembrarem ao público que o cinema não foi só feito para se comer pipocas); infelizmente, é, também, um filme derivativo e muitíssimo indulgente com ele próprio, nem sempre sabendo explorar convenientemente o autêntico potencial mítico que vai fazendo nascer a cada plano e a cada sequência.