Uma pintura que considero emocionante: A
Chávena de Chá, pintada por Columbano Bordalo Pinheiro, em 1898, e
exposta pela primeira vez na Exposição Extraordinária do Grémio
Artístico, comemorativa do Quarto Centenário do Descobrimento do Caminho
Marítimo para a Índia. Foi a terceira vez que Columbano expôs no Grémio
Artístico; dois anos depois, levaria A Chávena de Chá à Exposição
Universal, em Paris, na qual foi premiado com uma medalha de ouro. Hoje
refugiada no Museu do Chiado, a
tasseomante retratada neste quadro é Emília, mulher e modelo de
Columbano (podemos vê-la, por exemplo, como Vénus, desnuda numa das
telas alusivas ao Concílio dos Deuses, referentes à obra de Camões,
também no Museu do Chiado). Esta composição sombria evoca-me outra, de
igual modo belíssima, mas musical e da autoria do polaco Henryk Gorécki:
a Symfonia Piesni Zalosnych (Sinfonia de Canções Tristes), que nos
fala da angústia profunda de diversas mães que perderam os seus filhos.
Retirada do samovar, a água fervente funde-se com as folhas de chá para
formular feitios secretos que Emília, musa e Vénus de Columbano,
perscruta - que sortilégios se esvaecem no vapor sem serem decifrados,
que mensagens permanecerão para sempre perdidas, sem um destinatário? E a
Grande Guerra ali tão perto. Convido-vos a olharem com atenção para
esta imagem, ouvindo, ao mesmo tempo, a pungente peça de Gorécki. Um
precioso momento de cultura para enriquecer o vosso dia, porque a
cultura - a verdadeira - continua a fazer muita falta a todos nós; em
principal, nesta altura.